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Teorias Maior e Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica: Critérios e Limites de Responsabilização de Sócios, Administradores e Cotistas
A autonomia patrimonial é a fundação do Direito Empresarial, garantindo que o patrimônio da empresa e o dos sócios sejam separados. Isso é crucial para a segurança jurídica e para incentivar o investimento. Mas o que acontece quando essa autonomia é usada para cometer fraudes?
É aí que entra a Desconsideração da Personalidade Jurídica, uma medida excepcional que permite atingir o patrimônio dos sócios cotistas, como responsáveis. O objetivo é claro: coibir abusos, desvio de finalidade e confusão patrimonial.
Uma decisão recente da 33ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo reacendeu o debate sobre os limites da Desconsideração da Personalidade Jurídica.
O Tribunal afastou a desconsideração da personalidade jurídica de um fundo de investimento que havia sido admitida em primeira instância, em um caso de suposta fraude financeira, preservando o patrimônio dos cotistas.
Embora fundos de investimento não tenham personalidade jurídica formal, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconhece que essas estruturas titularizam direitos e obrigações e podem ser usadas de forma abusiva. Nesses casos, a Desconsideração da Personalidade Jurídica pode ser aplicada, exigindo-se a comprovação de abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
A Corte paulista utilizou como base o artigo 1.368-C do Código Civil, que é enfático: cotistas, via de regra, não respondem pelas obrigações do fundo. No entanto, para responsabilizar os cotistas, o Tribunal exigiu a aplicação rigorosa do Art. 50 do CC (chamamos de Teoria Maior). Isso significa que, além do abuso, era preciso demonstrar o efetivo e direto benefício auferido pelos cotistas em decorrência das manobras fraudulentas.
Diante da inexistência de vínculo entre os cotistas e o grupo fraudulento, e da ausência de indícios de blindagem patrimonial ou irregularidades no uso das cotas, a Câmara manteve a autonomia patrimonial do fundo de investimentos.
A manutenção da autonomia do fundo reafirma a natureza excepcional e subsidiária da Desconsideração da Personalidade Jurídica, que só deve ser aplicada para punir o abuso comprovado, e não para meramente facilitar a cobrança de dívidas.
Desconsideração da Personalidade Jurídica (DPJ): As Duas Teorias e Seus Limites.
A Desconsideração da Personalidade Jurídica é uma medida excepcional que visa suspender a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para garantir a satisfação dos credores, permitindo que as obrigações da empresa atinjam o patrimônio particular de seus sócios ou administradores.
Para sua aplicação, o ordenamento jurídico e a jurisprudência brasileira adotam duas vertentes principais, com critérios de aplicação distintos: a Teoria Maior e a Teoria Menor.
A Teoria Maior é a regra geral no Direito Civil e Empresarial, sendo a mais amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência, exigindo critérios rigorosos para a superação da autonomia patrimonial.
| Critério Essencial | Detalhamento Legal (Art. 50 do CC) |
| Abuso da Personalidade Jurídica | O requisito indispensável para a aplicação da DPJ. |
| Caracterização do Abuso | 1. Desvio de Finalidade (§ 1º): Uso da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores ou para prática de atos ilícitos. 2. Confusão Patrimonial (§ 2º): Ausência de separação de fato entre os patrimônios, como o cumprimento repetitivo de obrigações recíprocas. |
| Alvo da Responsabilização | Atinge apenas o sócio ou administrador que foi beneficiado direta ou indiretamente pelo abuso. |
Por outro lado, a Teoria Menor, previsto no art. 28, §5º do CDC, é aplicável para relações de consumo e adota critérios mais flexíveis em consideração da vulnerabilidade do consumidor.
| Critério Essencial | Detalhamento Legal (Art. 28, § 5º do CDC) |
| Obstáculo ao Ressarcimento | A personalidade jurídica representa, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento dos prejuízos causados aos consumidores. |
| Dispensa de Prova | Não exige a comprovação de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial. A insolvência do fornecedor já é, em regra, suficiente. |
| Fundamento | O risco da atividade empresarial não deve recair sobre o consumidor, devendo ser suportado pela empresa. |
Embora seja mais abrangente, o STJ tem imposto limites relevantes à aplicação da Teoria Menor, especialmente em relação à responsabilização pessoal do indivíduo aos atos de gestão da empresa. No acórdão vencedor do REsp 1.900.843, o corte determinou que sócios que não exercem atos de gestão, não podem ser responsabilizados com base no art. 28, §5º do CDC.
Ainda, no julgamento do REsp 1.862.557, o mesmo corte determinou que administradores não sócios também não podem ter seu patrimônio pessoal atingido com base na teoria menor, uma vez que o CDC não prevê expressamente que administradores podem ser responsabilizados, ao contrário do que ocorre no art. 50 do Código Civil (teoria maior). Assim, a responsabilização dos administradores não sócios está condicionada à comprovação de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial, nos termos da teoria maior.
A análise detalhada das Teorias Maior e Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica, juntamente com os limites impostos pelo STJ, revela uma verdade inegável: a separação patrimonial é um direito fundamental, mas exige gestão estratégica para ser preservada.
O Direito Empresarial não exige apenas o cumprimento da lei, mas a adoção de medidas preventivas que garantam a segurança jurídica do seu negócio e do seu patrimônio pessoal.
A prevenção é sempre mais eficaz e econômica do que o litígio. Seja na estruturação de um novo negócio, na reorganização societária ou na consultoria de gestão de risco, uma assessoria jurídica especializada é crucial para garantir que você e sua empresa naveguem com segurança neste cenário complexo.
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