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A VACINAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

5 de novembro de 2021

A advocacia trabalhista no período da pandemia se acostumou a ter surpresas, quase que diárias, com as medidas provisórias que eram editadas constantemente, com o objetivo de regularizar a situação do trabalhador e do empresário.

Embora não estejamos mais em estado de calamidade pública (o Decreto Legislativo 6/2020, que estabeleceu estado de calamidade perdeu validade em 31/12/2020 e não foi renovado), ainda encaramos consideráveis instabilidades jurídicas.

Nesse sentido, em 01/11/2021, o Ministério do Trabalho publicou a Portaria 620 para proibir a demissão de pessoas que não foram vacinadas contra a Covid-19.

De acordo com a Portaria 620, o empregador pode estabelecer orientações e incentivar a vacinação de seus trabalhadores para mitigar os riscos de transmissão da Covid-19, podendo oferecer a testagem periódica que comprove a não contaminação pela Covid-19, contudo, a exigência de apresentação do comprovante de vacinação, para admissão ou permanência do trabalhador no emprego, é proibida e considerada ato discriminatório.

Caso haja demissão pela recusa de comprovar a vacinação, o empregado pode optar pela reintegração ao cargo ou receber o dobro da remuneração referente ao período de afastamento, bem como pleitear indenização por danos morais.

Os defensores da Portaria alegam que a exigência de vacina viola a Constituição Federal, a Convenção da OIT nº 111, a Lei 9.029/1995 e os termos da Portaria 1.246/2010 do MTE, pois limita a manutenção do emprego e acaba por discriminar e segregar parte da população que, por motivos diversos, ainda não se decidiu pela vacinação.

Analisando o cenário, é possível perceber que a referida Portaria causa grande incerteza e insegurança jurídica para o empregador, que arca com todos os ônus da atividade empresarial, além de ser claramente inconstitucional. Senão vejamos:

Primeiramente, as Portarias Ministeriais são importantes instrumentos de regulação de políticas e visam a definir instruções para a execução das leis aprovadas pelo Poder Legislativo, ou seja, as Portarias devem regulamentar a lei, não, criá-la, como faz a Portaria 620, ao proibir empregador de exigir comprovante de vacinação para a contratação do empregado ou manutenção do emprego, considerando que essa exigência é discriminatória.

Vejam, não há lei sobre demitir trabalhadores não vacinados. Logo, o Governo Federal não poderia editar Portaria para o tema.

Segundo, a Portaria atropela a competência federal para editar normas sobre saúde pública e desestimula a vacinação.

Em terceiro lugar, a Portaria deixa o empregador em uma encruzilhada, visto que ele deve cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, sendo responsável pelo ambiente de trabalho saudável aos seus empregados, mas não pode estabelecer as regras que entende ser necessárias para tanto.

Além disso, a Portaria é oposta ao guia técnico do Ministério Público do Trabalho e ao entendimento do TST.

Em recente entrevista, a presidente do TST, ministra Maria Cristina Peduzzi, declarou que os empregados que recusarem a vacina podem ser demitidos, inclusive com justa causa.

No mesmo sentido, o Ministério Público do Trabalho se posicionou como favorável à demissão por justa causa de trabalhadores que se recusassem a tomar vacina sem apresentar razões médicas documentadas.

Também podemos citar, dentre os argumentos que corroboram que a realização da vacinação é obrigatória:

• Na Lei 13.979/20 consta a determinação de realização compulsória de vacinação;
• O §5º da Portaria 597/2004 do Ministério da Saúde, que instituiu em todo território nacional os calendários de vacinação, já trazia a previsão de exigência de apresentação de comprovante de vacinação para fins de contratação de empregado;
• A Portaria 620 contraria o inciso XXII, do artigo 7º da Constituição Federal que garante aos empregados a segurança e saúde em suas atividades.

Ainda, a Súmula 443 do TST já considera o entendimento da Justiça do Trabalho sobre a dispensa discriminatória, ainda que se tenha de analisar as características de cada caso. Portanto, não existe espaço para a Portaria 620 em nosso ordenamento jurídico.

Assim, mesmo não havendo na legislação trabalhista qualquer previsão expressa quanto à possibilidade do empregador obrigar o empregado a se vacinar, ao interpretar o conjunto de normas de segurança e saúde do trabalho, bem como a legislação aplicável à pandemia, pode-se chegar à conclusão que a empresa teria muitos argumentos em sua defesa, se optasse em condicionar o contrato de trabalho à vacinação.

A Portaria com toda certeza será questionada no Judiciário e o que se deve fazer, pelo menos por enquanto, é seguir a Portaria: i) disseminar políticas de conscientização sobre a importância da vacina, associada a políticas de prevenção e reforço quanto à observância necessária dos protocolos de prevenção da doença, tanto no ambiente de trabalho quanto fora dele; ii) não exigir comprovante de vacinação; iii) não demitir por justa causa o empregado que recusar comprovar a vacinação; e, se for o caso, exigir o teste de forma periódica.

A equipe trabalhista do Viseu Advogados se coloca à disposição para quaisquer esclarecimentos necessários sobre o assunto.