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Shopping Center: Locação | É possível a revisão (judicial) do percentual de aluguel variável?
Não se questiona mais a razoabilidade e viabilidade da reavaliação, a cada período de três anos (atendidos os demais critérios legais), do piso remuneratório, usualmente denominado “aluguel mínimo mensal”, em contratos de locação de espaços comerciais em empreendimentos sob o regime de shopping center.
Quanto à possibilidade de revisitar o percentual contratualmente fixado entre as partes para a apuração do aluguel mensal variável — critério que integra as regras de remuneração do shopping em contratos dessa natureza — calculado sobre uma determinada base geralmente relacionada ao desempenho das vendas e/ou serviços de uma atividade específica, merece destaque e deve ser avaliada com cautela.
Em geral, a adoção desse formato de remuneração e a fixação de um percentual sobre o faturamento ou receita do lojista não guardam correlação direta com o valor de mercado por metro quadrado do espaço físico locado. Pela sua própria essência, não é passível de comparação com a performance de outras unidades comerciais, mesmo localizadas no mesmo empreendimento, dado que cada empresa/lojista possui singularidades e particularidades próprias, dificultando igualdades ou semelhanças, mesmo em um determinado segmento.
Entretanto, devido aos diversos elementos necessários para caracterizar um empreendimento imobiliário sob o regime de shopping center, a fixação do percentual sobre o resultado positivo da exploração comercial não deve ser analisada isoladamente. Também não deve ser interpretada como imutável apenas pelo princípio contratual da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda).
A relatividade dos efeitos contratuais, com a consequente reavaliação do percentual originalmente fixado, pautada nos princípios da boa-fé e razoabilidade, é possível em casos nos quais tenha havido alteração das circunstâncias e premissas que nortearam a adoção do parâmetro de aluguel “participativo” entre as partes. Esses elementos embasaram a liberdade das partes (ou autonomia da vontade) na manifestação de sua vontade em contratar.
Se comprovadas alterações durante a relação locatícia que resultaram na mudança do cenário inicial, no qual se baseou o acordo mútuo, ou se houve expectativas de prosperidade do complexo comercial e retorno dos investimentos esperados, é cabível pleitear a revisão para equilibrar a relação contratual e adequar as condições à nova realidade ou situação econômica e subjetiva das partes.
A manutenção perpétua e coercitiva de um critério comercial cujos alicerces e premissas foram modificados ao longo do tempo por fatores alheios à vontade das partes teria como consequência prejuízos irreversíveis à saúde financeira do lojista e às atividades do comércio estabelecido no shopping. Isso vai contra a estrutura organizacional de empreendimentos sob o regime de shopping center, podendo impactar negativamente no crescimento econômico esperado desse tipo de complexo comercial.
Exemplos disso incluem alterações no horário de funcionamento e/ou encerramento das atividades dos lojistas, baixa performance contínua, vacância não gerenciada adequadamente, má utilização dos recursos do fundo de promoção com ações estratégicas de marketing ou campanhas promocionais que não atendam a sua finalidade. Tais variáveis podem levar à redução de faturamento ou à diminuição no fluxo de clientes.
Diante do arranjo organizacional peculiar a empreendimentos sob o regime de shopping center, é necessário considerar as peculiaridades e circunstâncias de cada caso concreto para avaliar se a cobrança de valores que se tornaram exorbitantes teve suas bases e princípios alterados. Isso com o propósito de permitir que as partes, pautadas nos princípios da boa-fé contratual, razoabilidade e proporcionalidade, possam discutir alternativas e soluções viáveis para manter o negócio sem prejudicar a saúde financeira do(s) lojista(s) e incentivar o crescimento desse tipo de negócio, que sofreu nos últimos anos devido à pandemia mundial. Evitar consequências que levem ao fechamento sucessivo de espaços comerciais e ao aumento da vacância é fundamental.
Por Giselle Vergal, sócia da área imobiliária.